Por que a sociedade moderna está cansada e em colapso?
O despertador toca pela terceira vez. Seus olhos se abrem, mas seu corpo parece afundado no colchão, como se um peso invisível o impedisse de levantar. Você olha para o celular e vê dezenas de notificações acumuladas — e-mails do trabalho, mensagens de cobrança, prazos se aproximando como um bando de lobos famintos.
O café da manhã é engolido às pressas, enquanto a mente já está atolada em reuniões, planilhas, tarefas pendentes. O trânsito parece pior do que nunca, cada buzina é uma facada nos nervos. Você chega ao escritório, senta-se à mesa e sente um cansaço esmagador antes mesmo de começar. Ao longo do dia, a sensação de estar sendo drenado se intensifica.
As metas são irreais, as cobranças incessantes, o sentido do que faz escapa por entre os dedos. O relógio avança, mas a exaustão não passa — ela se acumula, dia após dia, até que uma pergunta se forma na mente: até quando? Bem, até quando você não voltar a pensar de verdade.
O fenômeno do burnout é um sintoma de um mundo que se tornou refém de sua própria superficialidade, de um sistema que exige tudo do indivíduo e não lhe dá nada em troca. Mas para entender essa estafa mental, não podemos nos prender a jargões psicológicos de manual.
É preciso ir à raiz do problema, e essa raiz, meus amigos, está na desintegração da mente, na destruição sistemática da identidade e na colonização de sua consciência por um regime tecnocrático que não só o explora, mas o impede até mesmo de conceber uma vida digna.
O termo “burnout” começou a ser usado academicamente nos anos 1970, mas sua essência é muito mais antiga. Não se trata de um fenômeno novo. Desde os tempos em que a modernidade decidiu divorciar a moral da inteligência, o ser humano tem sido sistematicamente treinado para se ver como uma máquina de produção.
Vejam, o problema do burnout não está apenas no excesso de trabalho — ele está na perda do sentido do trabalho. O homem moderno é um autômato de escritório que se esgota porque tudo o que faz não passa de um jogo de aparências, uma encenação vazia para um patrão invisível.
Estou falando de “trabalhos inúteis”, uma constatação óbvia para qualquer um que já tenha se sentado por horas preenchendo planilhas que não servirão para nada. Mas o problema vai além. Não é só que o trabalho se tornou sem sentido — é que a própria vida social foi transformada num teatro grotesco onde todos fingem entusiasmo por metas irrelevantes e slogans motivacionais.
A técnica sufocou a inteligência. A administração eliminou o pensamento. O trabalho virou um exercício de controle e obediência, e não de criatividade e realização.
O burnout não é apenas o cansaço físico e mental. É um estado de ruína de ser. O sujeito burnout é aquele que, por força de um sistema, perdeu toda a conexão com sua vocação, sendo reduzido a uma peça descartável do maquinário burocrático global. Ele é ensinado desde pequeno a “se esforçar”, “ser produtivo”, “vencer na vida” — mas ninguém lhe diz que o prêmio ao final desse esforço é um colapso nervoso.
O que alimenta esse estado de exaustão não é apenas o excesso de trabalho, mas a positividade forçada. A sociedade do desempenho exige que todo mundo esteja sempre motivado, sempre buscando crescimento, sempre se superando. Qualquer hesitação é tratada como fraqueza, qualquer crítica é vista como negatividade.
Isso cria uma falsa moral da produtividade, onde a única coisa proibida é o ócio. Byung-Chul Han estava certo ao dizer que vivemos numa sociedade onde o cansaço é uma imposição estrutural, e não uma consequência natural.
Bertrand Russell já advertia que a obsessão pelo trabalho por si só é um sintoma de uma civilização doente. Aristóteles via a contemplação como a forma mais elevada da existência humana. E, no entanto, hoje, até o lazer foi instrumentalizado: não descansamos mais porque queremos sempre performar nos hobbies e “recarregar as baterias” para mais um dia de trabalho infernal.
O homem moderno tem horror ao silêncio, porque o silêncio o obriga a confrontar o vazio de sua própria vida. Ele precisa estar constantemente ocupado, não porque isso lhe traga algum benefício real, mas porque o ócio lhe parece insuportável. Ele é incapaz de ficar sozinho sem uma tela, sem uma distração. Sua mente está tão encharcada de estímulos artificiais que ele perdeu completamente a capacidade de reflexão.
A única forma de escapar desse ciclo de exaustão e alienação é recuperar a dignidade da vida intelectual. O trabalho precisa voltar a ser uma atividade com significado, e não uma imposição artificial. Isso significa que devemos reaprender a distinguir entre o que é essencial e o que é ruído. Significa que devemos recuperar a capacidade de pensar por nós mesmos, sem nos deixar levar por métricas corporativas e slogans de autoajuda.
A solução para o burnout não está em palestras de coaching ou em “mudanças de mindset”. Está em recuperar a conexão com aquilo que faz o trabalho valer a pena. Está em abandonar a ilusão de que o sucesso é uma questão de esforço cego. Está em reconquistar a liberdade de dizer “não” às demandas absurdas de uma sociedade que vê o ser humano apenas como uma engrenagem descartável.
Faço este apelo desde muito tempo: Deixem de lado os conselhos de gestores e gurus motivacionais. Recuperem o domínio sobre seu próprio tempo. Aprendam a contemplar, a desfrutar do silêncio, a desconfiar das exigências insanas do mundo moderno. O verdadeiro triunfo não é o de quem se mata de trabalhar, mas o de quem sabe quando parar e dizer: “isso não vale a minha vida”.
O primeiro passo para derrotar o burnout é simplesmente aprender a pensar outra vez.
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@lealmurillo | Jornalista | Top Voice LinkedIn | Storytelling e Conteúdo